Elisa - Memória e emoção se grudam, se integram. Essa é a única possibilidade; para mim, é na emoção que a memória se cola.
Rubem - Voltando à questão da escola, o problema é que ela retirou a emoção do processo de aprendizado. E sabe por quê? Porque a escola só trabalha com conteúdos que podem ser avaliados.
Elisa - As pessoas que chegaram ao cume das suas carreiras - seja um Nelson Freire, seja um Einstein ou um Freud - eram movidas tanto pela emoção quanto pela razão, claro.
Rubem - A razão pertence à caixa das ferramentas, a emoção pertence à caixa dos brinquedos.
Elisa - (...) Eu não desprezo a gramática, minha experiência com análise sintática foi realmente muito boa. Tive um professor apaixonado por ela, (...) Por isso acho que trato essa questão como ferramenta que muitas vezes me salva. É preciso que os professores ensinem os alunos a utilizá-las, fazer uma ligação entre elas e a emoção, o brinquedo, a vida, eu sou o sujeito determinado da minha oração principal, que é minha vida. (...)
Rubem – É certo, mas é que você aprendeu a gostar.
Elisa – Eu gostava de ler, e aí um dia me explicaram... Eu já tinha a emoção antes, já era uma boa leitora.
Rubem – O que estamos discutindo é o seguinte: se for apresentado ao aluno um texto, poético ou não, pela primeira vez, com aquela carga de “anatomia”, isso pode ser assustador.
Elisa – Sim, mas se ele já tiver sido fisgado emocionalmente, torna-se uma brincadeira. A partir daí, qualquer um pode viajar pelo tema que já ama.
Rubem – Temos de amar primeiro. Eu entrei para a literatura muito tarde, mas fui muito influenciado por um professor que tive no ginásio. Ele se chamava Leônidas Sobrinho Porto. O Leônidas tinha uma cara de bolacha. Quando chegou à classe pela primeira vez, ele disse assim: “Temos duas questões preliminares para resolver. A primeira questão é a presença. Fiquem tranquilos, todos vocês tem 100% de presença. A segunda questão a ser resolvida é relativa à aprovação: informo que todos vocês já passaram. Então, tendo deixado de fora essas duas questões, vamos nos dedicar à literatura”. Assim, quando ele dava aula, todos nós ficávamos paralisados, porque ele encarnava o que nos apresentava. Começamos a perceber que literatura era uma coisa absolutamente fantástica. Ele não nos ensinou detalhes sobre literatura, nem sobre análise sintática, nem sobre coisa nenhuma. Ele encarnou a literatura, e aquilo ficou absolutamente inesquecível. Então, vejo muito disso no professor, se o professor não for possuído por essa paixão, não poderá comunicar isso.
Elisa – É verdade. Por exemplo, eu fui uma aluna de geografia “desperdiçada”. (...) Depois até escrevi um poema sobre isso, chamado “Mapa-me”. O que quero dizer é o seguinte: eu poderia ter me aprofundado em geografia. Mas, então, o que aconteceu? O problema é que eu era obrigada a decorar: Peru – capital Lima.
Rubem – Sem dúvida um bom professor é aquele que transmite uma emoção junto com a informação. Porque a palavra emoção, do latim, tem sua origem em “mover”; emocionar, “coisa que move”; comover, “mover junto”. (...) O que isso tem a ver com pedagogia?
Um comentário:
Esse diálogo devia ser lido por todos os professores que desejem quebrar o gelo, aproximar-se de seus alunos e fazer um bom trabalho em sala de aula. Esses dois são 10.
Beijo, Mô.
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